Como denota a sua etimologia, epidemiologia é definida como “o estudo da distribuição da doença ou de uma condição fisiológica nas populações humanas e dos fatores que influenciam essa distribuição” (LILIENFELD, 1978).

Frost (1941), com uma descrição mais abrangente, enfatiza que ” A Epidemiologia é essencialmente uma ciência indutiva, preocupada não apenas em descrever a distribuição da doença, mas igualmente, ou até mais, em encaixa-la numa filosofia mais abrangente”.

Dessa forma, a informação obtida através de uma investigação epidemiológica deve ir além de uma mera descrição da distribuição da doença em diferentes populações (Epidemiologia Descritiva). Deve ser utilizada também para estabelecer a etiologia de uma doença específica (Epidemiologia Etiológica), avaliar a consistência dos dados epidemiológicos com hipóteses clinicas ou experimentais (Epidemiologia Analítica) e proporcionar a base para o desenvolvimento e a avaliação de procedimentos preventivos e práticas de saúde pública (Epidemiologia Experimental/de Intervenção).

A epidemiologia em periodontia deve atender à incumbência de fornecer dados sobre a prevalência das doenças periodontais em diferentes populações, bem como a frequência em que elas ocorrem, a severidade de tais condições e proporcionar a documentação referente à efetividade das medidas preventivas e terapêuticas direcionadas a tais doenças em nível populacional.

A doença periodontal é uma condição ou um processo inflamatório e imunológico que acomete a gengiva (gengivite) e/ou os tecidos de suporte dentários (periodontite) resultando na sua destruição. Pode ser causada por múltiplos fatores, como, a suscetibilidade do hospedeiro, a condição do meio local e a presença elevada de microrganismos odontopatogênicos e apresentam diferentes extensões e gravidades. A placa bacteriana ou biofilme é considerado um fator determinante para que ocorra a doença periodontal. Grandes depósitos bacterianos são regularmente associados a formas localizadas de doenças dos tecidos duros e moles subjacentes. Em 1 mm³ de placa dental pesando aproximadamente 1 mg, estão presentes mais de 10bactérias. As comunidades bacterianas presentes na cavidade oral são extremamente complexas, estimando-se o envolvimento de cerca de 700 espécies (Bartold & Dyke, 2013).

A gengivite é caracterizada pelos sinais clínicos da inflamação restritos à gengiva e a reversibilidade da doença, pela remoção da etiologia ou etiologias. Pode ser associada a somente a placa dental ou modificada por fatores sistêmicos, medicamentos e má nutrição. Quando não associada a placa dental pode ainda ser de origem bacteriana específica, viral (herpes vírus), fúngica (candidose), genética (fibromatose gengival hereditária) e ainda por condições sistêmicas, reações alérgicas, lesões traumáticas, reações a corpo estranho ou especificadas de outras maneiras.

A periodontite pode ocorrer devido a uma evolução da gengivite, que neste caso irá resultar em uma destruição dos tecidos de suporte dentários podendo ser exacerbada devido a fatores hereditários e ambientais, má higiene oral, tabagismo, medicamentos imunossupressores e estresse. Também pode ocorrer como manifestações sistêmicas, desordens hematológicas e genéticas.

Crianças e adolescentes podem ter qualquer uma das várias formas de periodontite, conforme descrito nos trabalhos do Workshop Internacional de 1999 para Classificação de Doenças e Condições Periodontais (periodontite agressiva, periodontite crônica e periodontite como manifestação de doenças sistêmicas). No entanto, a periodontite crônica é mais comum em adultos, enquanto a periodontite agressiva pode ser mais comum em crianças e adolescentes (ARMITAGE, 1999), sugerindo neste caso uma predisposição genética.

O desenvolvimento e a evolução da periodontite são dependentes da resposta imune do hospedeiro (HART; ATKINSON, 2007) e o seu aparecimento precoce parece estar relacionada a doenças sistêmicas ou alterações no sistema imunológico. Algumas condições sistêmicas ou hereditárias como a Hipofosfatasia, a síndrome de Down, a síndrome de Papillon-Lefèvre, Leucemias e Aids, entre outras, podem apresentar relação com o aparecimento precoce de alterações periodontais graves em crianças e adolescentes.

Estudos epidemiológicos indicam que a gengivite é praticamente universal em crianças e adolescentes, sendo a presença da placa bacteriana o principal desencadeador deste processo, resultando em uma inflamação na gengiva, que na maioria das vezes se mantém rápida, superficial e uma ligeira vermelhidão na gengiva marginal, porém, se houver um desequilíbrio entre a ação microbiana e a resposta de defesa do hospedeiro, pode evoluir para periodontite, provocando a perda dos tecidos de suporte dentário e um possível agravamento de condições sistêmicas pré-existentes. O diagnóstico precoce da doença periodontal, além de ser fundamental para a resolução do mesmo, poderá orientar o clínico para presença de outras patologias sub-diagnosticadas como leucemias ou neutropenias. Desta forma, é comum encontrar defeitos na função dos neutrófilos, quando se diagnostica periodontite em crianças saudáveis, como periodontite juvenil localizada e periodontite pré-pubertária.

Pode-se concluir que na criança, a doença periodontal surge nas sua forma mais leve ou moderada, raramente originando desconforto, estando a gengivite presente em mais de metade das crianças e jovens. Contudo a gengivite pode ter uma evolução para uma situação mais grave com o passar do tempo, desta forma faz-se necessário diagnosticar e tratar precocemente este tipo de patologia em pacientes jovens. A ocorrência de alterações periodontais é observada com frequência nos casos de alterações sistêmicas, que se manifestam desde uma inflamação gengival até as formas mais destrutivas, como a periodontite agressiva, levando, em alguns casos, à esfoliação precoce de dentes.

 

Referências

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  2. VIEIRA, Thaís Ribeiral; PERET, Adriana de Castro A.; PERET FILHO, Luciano Amédée. Alterações periodontais associadas às doenças sistêmicas em crianças e adolescentes.Rev. paul. pediatr.,  São Paulo ,  v. 28, n. 2, p. 237-243,  June  2010 .   Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010305822010000200017&lng=en&nrm=iso>. access on  07  Sept.  2017.  http://dx.doi.org/10.1590/S0103-05822010000200017.
  3. Hart TC, Kornman KS. Genetic factors in the pathogenesis of periodontitis. Periodontol 2000 1997;14:202-15.
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