Trauma de oclusão é o termo usado para descrever as alterações patológicas ou mudanças adaptativas que ocorrem no periodonto em consequência das forças indevidas produzidas pelos músculos da mastigação. Outros termos frequentemente utilizados são: oclusão traumática, trauma oclusal, oclusão traumatogênica, traumatismo periodontal, sobrecarga etc. A força oclusal excessiva, além de causar danos aos tecidos periodontais, também pode causar lesões, por exemplo, na articulação temporomandibular, nos músculos mastigatórios e na polpa dental.

Algumas definições do trauma de oclusão:

  • Stillman, 1917: “ Uma condição, em que ocorrem lesões às estruturas de suporte dos dentes, resultante do ato que leva os maxilares a uma posição de fechamento.”
  • OMS,1978: “ Dano causado ao periodonto pela pressão produzida sobres os dentes, direta ou indiretamente, pelos dentes antagonistas.”
  • American Academy of Periodontology, 1986: “ Uma lesão do sistema de inserção em consequência de uma força oclusal excessiva.”

As forças traumáticas podem agir em um único dente ou um grupo de dentes que estejam em contato prematuro, podem ocorrer em associação com hábitos parafuncionais (apertamento dental e bruxismo), em conjunto com a perda ou migração de pré e molares, acompanhada da separação gradual dos dentes anteriores.

A lesão tecidual associada ao trauma de oclusão é dividida em primária e secundária.

A forma primária inclui uma reação (dano) tecidual que compromete toda a volta de um dente com periodonto de altura normal. A forma secundária, inclui reações teciduais (danos) em dente com um periodonto reduzido. É necessário intensidade de carga suficiente para comprometer o periodonto. O periodonto com altura reduzida, pequenas forças podem produzir lesões traumáticas ou mudanças adaptativas no periodonto.

Defeitos Ósseos Periodontais

O colapso periodontal de um sítio específico compromete o prognóstico em longo prazo dos dentes pela produção de três tipos de defeitos: defeitos supra-ósseos (horizontais), defeitos infra-ósseos (verticais) e defeitos inter-radiculares (furca).

De acordo com a classificação de Goldman e Cohen (1958), defeitos supra-ósseos são aqueles cuja base da bolsa está localizada coronal à crista alveolar. Defeitos infra-ósseos são definidos por uma localização apical da base da bolsa em relação a crista alveolar residual. Quando o defeito afeta um dente, este é chamado de defeito infra-ósseo, quando os defeitos afetam duas raízes adjacentes em proporções semelhante são chamados de crateras.

Trauma de Oclusão e Doença Periodontal Associada a Placa

Conceitos de Glickman e Waerhaug

Glickman (1965,1967) afirmou que a via de propagação da lesão gengival associada a placa poderia ser alterada, se forças de intensidade anormal atuarem sobre os dentes que apresentem placa subgengival, caracterizando que o caráter da destruição progressiva do periodonto do “dente traumatizado” será diferente de um dente “não traumatizado”.

Segundo Glickman, as estruturas periodontais podem ser divididos em duas zonas:

  1. Zona de irritação: inclui a gengiva marginal e a gengiva interdental, sendo limitado apenas de um lado pelo dente, desta forma não é afetada pelas forças de oclusão, logo uma inflamação gengival não poderá ter sido causada por um trauma de oclusão e sim pela irritação por placa bacteriana. A lesão associada à placa em um dente “não traumatizado” propaga-se via apical, envolvendo primeiro o osso alveolar e posteriormente à área do ligamento periodontal. A progressão dessa lesão resulta em destruição supra-ósseas (horizontal) uniforme.
  2. Zona de co-destruição: inclui o ligamento periodontal, o cemento radicular e o osso alveolar, sendo demarcada coronariamente pelos feixes de fibras colágenas transeptais (interdentárias) e dentoalveolares (se projetam do cemento, em forma de leque, em direção ao tecido gengival livre das superfícies vestibular, lingual e interproximal).

Na zona de irritação dos dentes que não foram submetidos ao trauma, a lesão inflamatória pode propagar-se para o osso alveolar e nos dentes submetidos ao trauma de oclusão, o infiltrado inflamatório estende-se diretamente ao ligamento periodontal.

Glickman (1976), em um estudo de revisão, afirmou que o trauma de oclusão é um fator etiológico (co-destrutivo) importante em situações nos quais os defeitos ósseos angulares combinados com bolsas infra-ósseas são encontrados em um ou vários dentes.

Waerhaug (1979) em suas análises, concluiu que a perda de inserção conjuntiva e a reabsorção óssea em torno dos dentes são resultantes exclusivamente das lesões inflamatórias associadas à placa subgengival. Os defeitos ósseos angulares e as bolsas infra-ósseas ocorrem com igual frequência tanto no periodonto de dentes não afetados pelo trauma de oclusão como em dentes traumatizados, afirmando desta forma que o trauma de oclusão não está associado na propagação da lesão gengival para a “ zona de co-destruição”. Concluiu que os defeitos ósseos angulares e as bolsas infra-ósseas (verticais) ocorrem quando a placa subgengival de um dente atinge o nível mais apical do que a microbiota do dente vizinho e quando o volume do osso alveolar que circunda as raizes é comparativamente grande.

Em resumo Glickman afirma que o trauma de oclusão é um fator agravante na doença periodontal (fator co-destrutivo) enquanto que Waerhaug afirma não haver relação entre o trauma oclusal e o grau de destruição periodontal, sendo este como um resultado das lesões inflamatórias associadas à placa gengival.

Experiências Clínicas

Foram realizados diversos estudos em relação aos defeitos ósseos angulares, bolsas infra-ósseas e mobilidade dental (sinal importante de trauma de inclusão). Seguem resultados de alguns dos autores:

Rosling, 1976: “As bolsas infra-ósseas em dentes com mobilidade excessiva demonstram o mesmo grau de reparo que aquelas apresentadas em dentes sem mobilidade”.

Fleszar et al, 1980: “ Bolsas em dentes com mobilidade visível clinicamente não respondem tão bem ao tratamento periodontal quanto às bolsas dos dentes sem mobilidade que apresentam doença periodontal com a mesma gravidade”.

Philstrom et al, (1986): “Dentes com aumento da mobilidade e do espaço do ligamento periodontal tinham bolsas mais profundas, maior perda de inserção e menos suporte ósseo do que dentes sem essas características”.

Burgett et al, (1992): Estudaram o efeito do ajuste oclusal no tratamento da periodontite. Os resultados mostraram que houve ganho de inserção 0,5 mm maior nos pacientes que receberam raspagem e ajuste oclusal quando comparados a raspagem sozinha.

Trauma Ortodôntico

Quando um dente é exposto a forças unilaterais de intensidade, frequência ou duração em que os tecidos periodontais não sejam capaz de suportar ou distribuir, ocorre uma adaptação das estruturas periodontais. Se a coroa de um dente for submetida a forças de direcionamento horizontal, o dente tende-se a inclinar em direção da força. Essa força de inclinação resulta no desenvolvimento de zonas de pressão e tensão nas áreas marginal e apical do periodonto. As reações teciduais que ocorrem são o aumento da vascularização, aumento da permeabilidade vascular, trombose e desorganização das células e feixes de fibras colágenas. Se a intensidade das forças estiver dentro do limite de manutenção de vitalidade das células do ligamento periodontal logo aparecem os osteoclástos na superfície do osso alveolar na zona de pressão, ocorrendo reabsorção óssea direta. Se a intensidade da força aplicada for maior, o resultado pode ser a necrose do ligamento periodontal na zona de pressão, decomposição de vasos, matriz e fibras, os osteoclastos irão surgir nos espaços medulares do tecido ósseo adjacente, onde a concentração de pressão é menor do que no ligamento periodontal e inicia-se um processo de reabsorção óssea indireta. Ao mesmo tempo em que ocorre as alterações na zona de pressão, irá ocorrer aposição óssea na zona de tensão, a fim de conservar a espessura do ligamento periodontal nessa área. Quando o dente se inclina até uma posição em que as forças são anuladas, ocorre o reparo dos tecidos periodontais tanto na zona de pressão quanto na zona de tensão, e o dente torna-se estável na nova posição.

Em um periodonto saudável, os movimento ortodônticos de inclinação ou deslocamento do dente não provocarão inflamação gengival ou perda de inserção (retração ) do tecido conjuntivo.

Portanto, as forças unilaterais direcionadas as coroas dos dentes não induzirão reações inflamatórias na gengiva nem causarão perda de inserção do tecido conjuntivo. Entretanto estudos tem demonstrado que forças ortodônticas que produzem movimentos de deslocamento ou inclinação dos dentes podem resultar em retração gengival e perda de inserção do tecido conjuntivo, em áreas com gengivite (Steiner et al 1981; Wennström et al 1987).

Trauma alternado

São experiências nas quais as formas traumaticas foram aplicadas às coroas dos dentes alternadamente em direção vestibular e lingual ou mesial e distal. As zonas de pressão e tensão não foram identificadas claramentes, mas sim uma combinação de pressão e tensão em ambos os lados do dente submetido ao trauma alternado. As reações teciduais do ligamento periodontal provocadas pela combinação de forças de pressão e tensão pareceram ser semelhante ao dentes movidos ortodônticamente, com a única diferença de que a largura do espaço do ligamento periodontal no tipo alternado aumenta gradualmente de ambos os lados do dente.

Forças Alternadas no Periodonto normal

  • O espaço do ligamento gradualmente se ajusta a nova situação.
  • Aumento da mobilidade dentária
  • Ajuste oclusal normaliza a largura do ligamento periodontal
  • Os dentes são estabilizados e recuperam a mobilidade normal.

Forças Alternadas no Periodonto reduzido, Saudável

  • Zonas de pressão e tensão combinadas exibem:
    • proliferação vascular
    • exsudato
    • trombose
    • Reabsorção óssea
  • Espessamento do ligamento periodontal
  • A mobilidade dentária aumenta progressivamente
  • O espaço do ligamento periodontal gradualmente se adapta a nova situação.
  • Aumento da mobilidade dentária
  • O tecido do ligamento recupera a composição normal.
  • Tecido supra-alveolar não é afetado
  • Não há progressão da perda de inserção

Pode-se concluir desta forma que “O periodonto reduzido saudável teve capacidade semelhante à do periodonto normal de se adaptar à demanda funcional alterada.”

Conclusões

O trauma de oclusão portanto não pode induzir à destruição do tecido periodontal. O trauma de oclusão pode, no entanto, resultar em uma reabsorção do osso alveolar, levando a uma mobilidade dentária, que pode ser de caráter provisório ou permanente.

Nos dentes com doença periodontal progressiva associada à placa, o trauma de oclusão pode, no entanto, sob certas condições aumentar a velocidade de progressão da doença, atuando como um co-fator no processo destrutivo. Mesmo quando cessado o trauma, se a doença periodontal não for tratada, o processo destrutivo continua.

Referências Bibliográficas

  1. LINDHE, J. Tratado de periodontologia clínica e implatologia oral, 5 o ed., Ed. Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, 2010