Acidentes em cirurgia oral, segundo Marzolla (2008), são aqueles que ocorrem durante o ato cirúrgico e as complicações são aquelas que irão surgir, seja logo após o ato operatório ou durante o pós-operatório. Um bom planejamento cirúrgico seguido de execução do procedimento com cautela pode minimizar ou prever algumas as complicações ou acidentes que possam ocorrer, assim como saber o limite de sua capacidade técnica para a execução daquele ato cirúrgico especificamente.

A revisão da história médica do paciente, assepsia e antissepsia, a atenção com a anestesia local, os exames complementares como radiografias adequadas e exames laboratóriais, manejos atraumáticos dos tecidos moles e duros, ter uma visão clara do campo operatório com o afastamento correto das estruturas (lingua, lábios, bochechas, mucosas) e aspiração suficiente, o ato cirúrgico se torna mais previsível e certamente a incidência e severidade dos acidentes e complicações irão ser diminuídos ou até mesmo inexistentes (Hupp, 2015).

Entre os acidentes mais comuns estão as fraturas ósseas, coronárias e radiculares, lesões nos dentes vizinhos ou do arco oposto, invasão ou penetração do seio maxilar, causando comunicação buco-sinusal, penetração do dentes nas vias respiratórias e digestivas, lesões dos tecidos moles adjacentes, em vasos e nervos, efisema após a extração. As complicações encontradas são dor pós operatória, alveolites, infecções locais ou sistêmicas, edemas, hematomas e hemorragias (MARZOLLA, 2008).

A anestesia local no consultório é realizada todos os dias e a incidência de complicações associadas ao uso do fármaco (anestésico) parece ser relativamente baixa, evidenciando que são seguros. As complicações decorrentes da anestesia local em odontologia podem ser classificadas em locais, restritas à cavidade oral ou face, sistêmicas, como toxidade e interações medicamentosas com outras substâncias e alterações locais que incluem incluem dor e queimação à injeção, parestesia, trismo, hematoma, edema, fratura de agulha, injuria em tecido moles, paralisia do nervo facial, infecções, lesões em mucosa, necrose dos tecidos e complicações oculares. Em geral são reversíveis e podem facilmente ser evitadas pelo uso de técnicas correta de anestesia local, manuseio adequado do instrumental de anestesia, conhecimento das soluções anestésicas e adesão ao protocolo de anestesia segura, com injeção lenta e aspiração prévia (MALAMED, 2013).

Acidentes

As causas mais comuns dos acidentes são as manobras intempestivas, uso de radiografias sem poder de diagnóstico, seleção de técnica cirúrgica incorreta, uso inadequado dos instrumentos cirúrgicos, desconhecimento da anatomia regional/local e planejamento incorreto ou insuficiente do ato cirúrgico.

  • Radiografias insuficientes ou distorcidas
  • Seleção da técnica cirúrgica mais compatível
  • Planejamento cirúrgico pouco abrangente
  • Desconhecimento da anatomia regional
  • Habilidade psicomotora inadequada
  • Uso inadequado do instrumental cirúrgico
  • Uso do instrumental cirúrgico inadequad

Fratura de coroa, raízes, cortical óssea e alvéolo

A fratura de coroa e raiz, geralmente é causada pelo uso incorreto de instrumentais cirúrgicos, como o fórceps, ou a alavanca, assim como o traumatismo do lábio pela compressão do fórceps, a fratura de dentes do arco inferior, a fratura da coroa de dentes vizinhos, além do próprio elemento que está sendo extraído. As pontas ativas dos fórceps são de acordo com a forma dos colos dos dentes superiores e inferiores e anatomia das raízes, assim os instrumentais utilizados para exodontias nos molares superiores direitos, são diferentes para o lado esquerdo. Mesmo com a utilização do instrumental correto, se a apreensão não for suficiente ou se os movimentos (lateralidade, rotação, avulsão) não respeitarem a dinâmica do dente e a anatomia das raízes, a fratura dental ou ainda alveolar poderá ocorrer. O movimento de rotação em dentes multirradiculares, certamente irá provocar uma fratura radicular, ou ainda do alvéolo dentário (MARZOLA, 2008).

Nas regiões de incisivos e pré-molares, a tábua óssea cortical das faces vestibulares dos dentes é consideravelmente mais delgada do que a face lingual. Na região de molares, o osso é mais espesso na superfície vestibular do que na lingual, além disso, o osso que cobre as superfícies radiculares é consideravelmente mais espesso do lado palatino do que do lado vestibular da maxilla (LINDHE, 2010), assim quando a força aplicada no instrumental no movimento de luxação foi maior que do que a resistência da tábula óssea, irá ocorrer a fratura.

Luxação e fratura mandíbular

Em exodontias de terceiros molares, principalmente dos inclusos, quando a força aplicada é maior do que a resistência do osso, principalmente pelo uso errado do instrumental ou emprego incorreto do movimento de alavanca pode levar a fratura mandibular. O nível de inclusão do dente ou a osteotectomia excessiva e a não prática da odontosecção, quando indicado, favorecem a incidência desse tipo de fratura. A aplicação de forças indevidas também podem levar a luxação da mandíbula, neste caso o côndilo mandibular se desloca para fora da fossa mandibular e não é capaz de retornar de forma espontânea. Quando isso ocorre, o profissional deve manter a calma e acalmar o paciente, seguido de uma manobra chamada de redução da mandíbula que consiste em forçar o côndilo mandibular a deslocar-se posteriormente, ultrapassando a eminência articular do osso temporal, o procedimento é realizado posicionando os dedos polegares na boca do paciente em visão frontal, apoiando os demais dedos na base da mandíbula e fazer uma movimentação para baixo e para trás e posteriormente para cima.

Comunicação buco-sinusal

O assoalho do seio maxilar se entende deste o primeiro pré-molar até a tuberosidade da maxila e em alguns casos alcança o alvéolo dos caninos e incisivos laterais. Assim, alguns dentes possuem raízes próximas ao assoalho do seio maxilar ou em contato direto com a mucosa sinusal, ou ainda recobertos apenas pela mucosa, principalmente os pré-molares e o primeiros molares superiores. Durante a exodontia destes dentes, uma impulsão pode ocasionar a perfuração da mucosa sinusal ou ainda devido ao movimento intempestivo com uma alavanca para extração de restos radiculares (OLIVEIRA ET AL, 2002; MARZOLA, 2008). É recomendável, sempre que houver a exodontia desses dentes, realizar o diagnóstico de comunicação buco sinusal, que pode ser obtido pela manobra de Valsalva, fechando as narinas do paciente e solicitar que o mesmo faça uma expiração com a finalidade de verificar se ocorre saída de ar pelo alvéolo do dentre extraído. Em casos de positividade, se possível, de imediato o profissional deve rodar um retalho vestibular para a realização de uma sutura oclusiva de estanque, ou encaminhar para um especialista. O diagnóstico de comunicação buco-sinusal é de extrema importância e não deve ser esquecido, pois se não tratada adequada e imediatamente, poderá ocasionar uma sinusite maxilar crônica, entre outras complicações.

Complicações

Muitas das complicações podem ser causadas devido a insuficiência de informações do exame clínico, principalmente pela anamnese, que tem a finalidade de obtenção de todas as informações do paciente, presentes e passadas e dos exames complementares como, os laboratoriais. São dados que fornecem informações valiosas para o estabelecimento do diagnostico definitivo, elaboração do prognóstico e a realização do planejamento do tratamento.

Como exames laboratoriais básicos para cirurgia oral podemos ter: (1) Hemograma, que é uma visão panorâmica, quantitativa e qualitativa dos elementos figurados no sangue (hemácias, leucócitos e plaquetas), (2) Coagulograma, que consiste na avaliação da hemostasia, tempo de sangramento, conjunto de fenômenos que ocorrem nos tecidos(vasos), nas células sanguíneas (plaquetas) e no plasma (proteínas), objetivando bloquear a perda de sangue após a lesão vascular. (3) glicemia em jejum, para medir a taxa de glicose no sangue, como diagnóstico de diabetes e monitoramento das taxas de pessoas diabéticas ou que tenham risco para a doença. Outros exames a considerar é a dosagem de creatina e ureia no sangue que tem a Importância de verificar se existe insuficiência renal, que pode ser provocada por diversas doenças, como hipertensão e diabetes e o exame de urina, que pode demonstrar inúmeras doenças sistêmicas (TOMMASI, 2014). Para pacientes diabéticos descompensados é recomendável o uso de profilaxia antibiótica prévia ao ato cirúrgico para diminuir os riscos de infecção.

Alveolite

A alveolite é caracterizada por uma forte sensação dolorosa no local em que se realizou a exodontia e seu inicio pode ser logo no terceiro ou quarto dia após o procedimento e não desaparece mesmo com o uso de analgésicos, se prolongando por vários dias. É classificada como seca ou purulenta, na alveolite seca há a desintegração total do alvéolo, tornando-se seco e sem sangramento, sensível a curetagem e halitóse. Na purulenta é caracterizada pela infecção, hemorragia e secreção purulenta.

A causa da alveolite pode estar relacionada a ausência parcial ou total do coágulo no interior do alvéolo, devido a possível infecção bacteriana (estafilococos e estreptococos) no ato cirúrgico. Segundo Marzolla, 2008, a falta de instrumental não esterilizado é causa mais comum e principal da infecção, assim como a retirada do coágulo por meios mecânicos pelo paciente com succção, palitos e bochechos. Além disso outros fatores podem estar relacionados como, infecção já do próprio dente ou de um dente vizinho, tabagismo, tempo do procedimento cirúrgico, higiene bucal precária ou inexistente. O tratamento é com anestesia local por bloqueio regional e não por infiltrativa para evitar a vasoconstricção local e maior isquemia do alvéolo, seguido de anestesia tópica no interior do alvéolo e curetagem para remoção do tecido necrosado e irrigação com soro fisiológico. Quando ocorrer o preenchimento do alvéolo com sangue, realizar a sutura e caso o sangramento não aconteça ou utiliza-se sangue venoso ou avivamento da mucosa na ferida cirúgica para provocar o sangramento. A prescrição de analgésicos ou anti-inflamatórios deve ser realizada e antibióticos em caso de disseminação local ou sistêmica da infecção (PORTELA et al, 2014; MARZOLLA, 2008).

Edemas e hematomas

Ocorrências de pequenos edemas devido a inflamação local no pós-operatório em exodontias, quando não está associado a infecções ou intervenções traumáticas é comum, porém quando de origem infecciosa é necessário a prescrição de antibióticos e terapia com aplicação de laser infravermelho (baixa intensidade) para atenuar os sintomas.

O hematoma ocorre no pós-operatório, principalmente em pessoas mais idosas (fragilidade dos vasos), devido ao rompimento ou perfuração de vasos sanguíneos e acúmulo de sangue no local, que podem se difundir nos tecidos vizinhos, impedindo a cicatrização, sendo causados pela aplicação da anestesia local ou insuficiência na coagulação e pode se resolver naturalmente em alguns dias (5 a 14 dias) (ESCODA, 1999; MARZOLA, 2008).

Hemorragia

Após a exodontia um pequeno sangramento é comum e ocorre a diminuição após os 30 a 60 minutos do pós-operatório, a colocação de sutura é eficaz para segurar o coágulo e deve ser realizada. Contudo, quando ocorrem problemas com a hemostasia, mesmo após algumas horas pode haver sangramento, desta forma, acima de tudo é fundamental a história clínica do paciente obtida durante a anamnese, assim como os exames complementares laboratoriais(coagulograma). Pacientes que fazem uso anti-coagulantes, devem ser alertados e neste caso o melhor é comunicar ao seu médico especialista sobre o procedimento cirúrgico a ser realizado e a possibilidade de suspender a medicação (ESCODA, 1999).

Na ocorrência de complicações com anestésicos locais é importante o profissional manter a calma e acalmar o paciente, explicando que a situação é transitória e o tratamento ou a solução são relativamente simples. Conhecer a natureza do anestésico e respectivo vaso constrictor para descartar as contra-indicações em relação a doenças sistêmicas ou interações medicamentosas ou outras substâncias. Planejar o procedimento a ser realizado e determinar a técnica anestésica mais indicada. Preparar o equipamento necessário para a anestesia, seringa tipo carpule, retro-carregada e com dispositivo de aspiração. A agulha deve ser descartável e pré-esterilizada. Os tubetes, preferencialmente de vidro e previamente desinfetados e nunca ultrapassar as doses máximas recomendadas por sessão.

A anamnese odontológica, deve ser feita minuciosamente, para identificar os medicamentos e substâncias consumidas pelo paciente, como forma de certificar-se que não haverá problemas durante os procedimentos cirúrgicos, assim como a solicitação dos exames complementares laboratoriais e uso de radiografias de qualidade com poder de diagnóstico. Com posse de todas essas informações, associado ao planejamento cirúrgico, cuidados pré-operatórios como a assepsia intra e extra oral, cuidado no manejo dos tecidos moles e duros durante o ato operatório, a seleção correta dos instrumentais e instruções pós operatórias ao paciente, o risco de ocorrência de acidentes e complicações em exodontias na rotina clínica provavelmente será menor.

Referências

MARZOLLA, C et al. Acidentes e complicações das exodontias. Rev. Foa., v. 1, p.61-72, 2008.

MALAMED, Stanley F. Manual de Anestesia Local. 6ª Edição. Rio de Janeiro, Editora Elsevier, 2013.

HUPP, J. R.; ELLIS, E. TUCKER, M. R. Cirurgia Oral e Maxilofacial Contemporânea. Elsevier, 6ed. 2015

TOMMASI, Maria Helena M.; Diagnostico em Patologia Bucal, 4º ed. , 2014

MALAMED, Stanley F. Manual de Anestesia Local. 6ª Edição. Rio de Janeiro, Editora Elsevier, 2013.

OLIVEIRA, H. W. de ; VEECK, E. B. Relação entre o seio maxilar e raízes dentárias, uma visão da tomografia computadorizada – relato de casos.

Revista Odonto Ciência – Fac. Odonto/PUCRS, v. 17, n. 35, jan,/ mar. 2002.

PORTELA et al, A COMPLICAÇÃO ALVEOLITE APÓS A REMOÇÃO DO TERCEIRO MOLAR INFERIOR: revisão de literatura; Revista de Iniciação Científica da Universidade Vale do Rio Verde, Três Corações, v. 4, n. 1, 2014, p. 94-104

ESCODA CG, Domínguez JA. Accidentes y complicaciones de la exodontia In: Escoda CG, Aytés LB. Cirugía bucal. 1ª edição. Madrid: Ergon; 1999; 10: p. 317-352